Saber dói

por Misha Gibson, que não é tão criança a ponto de saber tudo

171 Todo Dia

Terça, 26 De Maio De 2015 ás 06:00

Saber dói

Saber dói

"Mas não sou mais
Tão criança a ponto de saber tudo"
(Quase sem querer, Renato Russo / Dado Villa-Lobos / Renato Rocha)

Tem uma frase, acho que do John Lennon, que diz que a ignorância é uma bênção. E ela já serviu de desculpa pra muita gente fazer coisa errada, com o pretexto de que omitir não é o mesmo que mentir. Omitir não é o mesmo que mentir? Sei não... Acho que omissão é um tipo de mentira, pois você induz a outra pessoa a pensar/considerar uma não-verdade.

Esta frase também já serviu como desculpa para muita gente no momento em que é cobrado alguma coisa... Quanto mais se sabe, mais se é cobrado, não é assim?

Eu também já usei essa desculpa para reclamar de gente que finge não saber das coisas, ou para dizer que quem não sabe não tem responsabilidade. Será que é tudo isso mesmo? De repente é a responsabilidade inerente no saber que nos cobra, e não exatamente ignorar que seja a bênção...

Por isso que 'tudo o que sei é que nada sei' pode ser uma boa maneira de se esquivar de uma responsabilidade assim como uma grande maneira de se dizer que é preciso sempre aprender mais. Se meu pequeno escutasse essa frase, certamente a usaria para dizer que não é perfeito para saber tudo. Nem nunca será. E, portanto, não vale o esforço. Ora, ora... Quanto conformismo! (Ou seria pura preguiça?!)

Saber dói, porque é difícil aprender. Porque a gente resiste a mudar, porque dá trabalho, porque nos onera.

Tem uma outra face dura do saber. Saber alguma verdade nem sempre nos traz benefícios. As crianças são naturalmente cruéis, pois não sabem medir quando a mentira, ou a meia verdade, caberia mais confortavelmente para os ouvidos alheios. Os adultos preferem que as palavras sejam enganadoras para não terem que encarar a verdade fria e dura. Ignorância as vezes é bênção! Eu sempre sou a favor da verdade, embora eu ache que se a pessoa não precisa saber de algum fato, se ela nada pode fazer a respeito, então poupá-la seja de alguma educação. Mas, se ela perguntar...

O saber nada ou o saber tudo, no fundo, têm as mesmas cores e o mesmo peso. Quando a gente acha que sabe muito a respeito de uma coisa, nos sentimos isolados com a nossa ciência. Mas, quando não sabemos nada, sofremos de ignorância, por nos sentirmos perdidos e também sozinhos.

A consciência, aquele grilo falante, nos bombardeia (ou deveria nos bombardear) com o saber. Se a gente corta o dedo e não percebe, mal sente a dor. Mas, se o dedo sangra, o cérebro racionaliza a informação e imediatamente sentimos a dor do machucado. Se eu sei de algo que está errado, sofro muito até arrumar o errado, ou até que a situação se ajeite. Acho que é a tal ansiedade que não me deixa acomodar, aliada ao tal grilo falante.

Essa calma das crianças de não saber nada e saber tudo realmente faz uma diferença no processo de aprendizagem, porque elas não têm consciência do saber. E como é que a gente aprende a ter consciência? Como é que se amadurece a ponto de saber a consequência do que fazemos ou deixamos de fazer? Quando é que efetivamente aprendemos a saber?

Eu entendo que precisamos de um subterfúgio para expurgar nossa culpa e entendo os desdobramentos que o saber pode causar. Mas, ainda assim... Por que as pessoas não tomam para si o que aprenderam? Dói tanto assim? O saber provoca uma reação, talvez seja por isso que evitamos saber demais. Mas, a dor do saber não pode ser maior do que a dor do não saber.


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