Peaky Blinders, Sangue, Apostas e Navalhas

Para quem gosta de séries de época, Peaky Blinders é um convite irrecusável

Guto Oliveira

Campo Grande - Domingo, 02 De Janeiro De 2022 às 14h04

Peaky Blinders, Sangue, Apostas e Navalhas

Peaky Blinders, Sangue, Apostas e Navalhas

Ambientada na Inglaterra do começo do século XX, conta a história ficcional da família Shelby, liderada pelo tempestuoso e frio Thomas "Tommy" Shelby, brilhantemente interpretado por Cillian Murphy, ator e músico irlandês.

Os irmãos Shelby, Arthur e Thomas, estiveram nos campos de batalhas da I Guerra Mundial, e lutaram na França, onde dentre muitos trabalhos, escavavam túneis para plantar bombas para o inimigo, correndo altos riscos. Da experiência de guerra, trouxeram as estratégias e muitos traumas.

Arthur foi muito afetado e por isso, tem um temperamento altamente explosivo, enquanto Thomas sempre foi mais cauteloso e seu instinto de liderança prevaleceu nos campos de batalha, chegando à patente de Sargento-Mor.

Ao final da guerra, retornam à Birmingham e os irmãos, junto com seus aliados, passam a controlar a cidade com mão de ferro, atuando no ramo de apostas ilegais de corridas de cavalo, contrabandos de todos os tipos, incluindo drogas.

Eles se concentram no distrito de Small Heat, no coração Birmingham e a partir dali, expandem seus negócios por vários pontos da Inglaterra, chegando a atuar também nos Estados Unidos.

Thomas Shelby acaba se destacando e chamando a atenção de seus rivais, que traçam planos para acabar com o domínio dele e de sua família. Além de lidar com seus oponentes, o líder ainda vê transformações políticas, econômicas e sociais acontecerem em ritmo alucinante, no início do século 20.

Como se não bastasse tudo isso, Shelby ainda tem que lidar com os fantasmas de seu próprio passado, que rondam sua cabeça o tempo todo.

Com esse caldeirão de problemas, situações caóticas e muita ação, regada à violência, Peaky Blinders tem um roteiro extremamente convidativo, e entre reviravoltas e tragédias, vai tecendo a história dos Shelby de forma magistral.

Não perca de vista que eles fazem parte de uma gangue e são extremamente brutais, mas mesmo com todo esse peso, você acaba aceitando o chamado de fazer parte da família Shelby, por aderir ao apelo de estar ao lado dos chefões ou por medo de ir contra eles.

Peaky Blinders é uma série que encanta pelo ritmo acertado, fotografia deslumbrante, figurinos de época (impecáveis) e atuações únicas e apaixonantes.

Obviamente, Cillian Murphy como Thomas Shelby é o melhor personagem (e ele é, não tenha dúvida disso), mas muitas interpretações são impressionantes, como a de Helen McCrory como tia Polly Gray, Sam Neill como Chester Campbell, Tom Hardy como Alfie Solomons, Annabelle Wallis como Grace Burgess, Sam Clafin como Oswald Mosley, Paul Anderson como Arthur Shelby Jr, Aidan Gillen como Aberama Gold, Natasha O'Keeffe como Lizzie Stark, Finn Cole como Michael Gray e tantos outros, que dava para citar quase todo o elenco.

Este timaço faz desta, uma das melhores séries de época de todos os tempos.

🔸 Os impressionantes números da série

São cinco temporadas disponíveis na Netflix e em 2022 estreia a sexta e última. As cinco primeiras tiveram seis episódios cada, de cerca de uma hora de duração.

Quem começa a assistir, sente a necessidade de ver os próximos acontecimentos de tal forma, que é bem provável que cada temporada seja consumida em duas ou três vezes, no máximo.

Personagens fortes, reviravoltas e surpresas em seu desenvolvimento, ação, suspense, emoção e romances, aliados ao belíssimo figurino da série e sua esplêndida fotografia, tornam Peaky Blinders, uma candidata natural à muitos prêmios (mais de uma dezena já foram arrebatados) e a 6ª temporada é esperada com muita ansiedade, por fãs espalhados pelo mundo inteiro.

Sem contar que os números da audiência são impressionantes: as três primeiras temporadas foram vistas, em média, por 2,5 milhões de espectadores. A quarta pulou para 4 milhões e a quinta atingiu a impressionante marca de 7,2 milhões!

🔸 A trilha sonora de Peaky Blinders

Outro fator de cuidado esmerado, foi a escolha da trilha da série, que tem como destaque a música-tema.

• Red Right Hand, Nick Cave & The Bad Seeds

Esta canção, interpretada pela banda australiana, é intensa e extremamente impactante. Sua letra fala da mão direita vermelha (ensanguentada) de um homem alto e bonito, que facilmente é associada à Tom Shelby, mas é uma interpretação equivocada.

A referência vem de um poema de John Milton, escritor inglês, que publicou Paradise Lost, em 1667. O texto trata da punição dos anjos caídos, após a rebelião no paraíso, que culminou com Satanás induzindo Adão e Eva a comerem o fruto proibido da Árvore do Conhecimento, o que lhes custou o paraíso.

Nesse contexto, a mão direita é vermelha de sangue e pertence a Deus, que conta a seu Filho sobre a transgressão do homem e o próprio Cristo se oferece em sacrifício pela redenção da humanidade.

• Red Right Hand, cover por PJ Harvey

Além da música original de Nick Cave, lançada em 1994, Red Right Hand ganhou um cover pela cantora britânica PJ Harvey, especialmente para a série (aprecio infinitamente mais a original). Gosto mais da outra música da cantora, Long Snake Moan, bem apropriada à cena que ela embala, na segunda temporada.

• Lazarus, David Bowie

Bowie era um grande fã da série e decidiu enviar uma prévia de seu derradeiro disco, Black Star, para o produtor Steven Knight, sugerindo que alguma de suas músicas fizesse parte da trilha. Ele até ganhou a boina usada por Tommy Shelby na primeira temporada, entregue por Cillian Murphy.

Knight decidiu usar a música Lazarus, que tocou na terceira temporada. O clima non-sense da canção é perfeito para o ritmo da série, e com isso o camaleão do rock deixou sua marca em Peaky Blinders.

Bowie lançou Star Man no dia 8 de janeiro de 2016, dia do seu aniversário de 69 anos, e faleceu dois dias depois, por isso, o pedido feito ao produtor foi um de seus últimos desejos. Emocionante, não?

Para mim, David Bowie arquitetou seus últimos passos e ainda planejou lançamentos após a sua morte. Lendário, é um dos artistas mais carismáticos de todos os tempos.

• Atmosphere, Joy Division

Uma grata surpresa foi ouvir Atmosphere, dos britânicos do Joy Division.

Apesar de existirem por apenas 4 anos (1976-1980, terminando por conta do suicídio do vocalista Ian Curtis), o Joy marcou a história do pós-punk inglês.

Sua dissolução fez com que os remanescentes dessem origem à uma das bandas mais cultuados dos anos 80, o New Order, banda da qual sou fã declarado.

Atmosphere é um clássico, fiquei muito feliz de ouvi-la na quinta temporada, embora tenha sido em um momento bem triste do seriado.

• War Pigs, Black Sabbath

Para fechar a quinta temporada e a lista das músicas que considero emblemáticas em Peaky Blinders, um dos maiores sucessos do heavy metal, War Pigs, do Black Sabbath. A música é um hino anti-guerra, conforme diz o vocalista Ozzy Osbourne.

🔸 Os verdadeiros Peaky Blinders

Apesar de ser uma história fictícia, existiu uma gangue chamada Peaky Blinders em Birmingham e, segundo histórias locais, seu líder provavelmente foi Thomas Gilbert.

O grupo surgiu no final do século XIX,durante a crise econômica da classe trabalhadora britânica, e operou até os anos 10 do século XX, quando perdeu status para uma outra gangue. Formado por jovens desempregados, eles ganharam poder através de crimes como roubos, contrabando, sequestros e outras atividades ilícitas, incluindo manipulação de apostas e corridas de cavalos.

Eles se distinguiam pela vestimenta alinhada, com casacos sob medida, com lapela, coletes, lenços de seda, calças boca de sino, boinas  e botas de couro.

Eles cresceram quando disputaram o poder em Birmingham e vizinhança, derrotando grupos rivais, dentre eles, outra famosa gangue da época, conhecida como Sloggers. No começo do século XX, sofreram revezes pelo enfrentamento de um grupo maior, os Birmingham Boys, chefiados por Billy Kimber.

Mesmo tendo desaparecido na década de 1930, o nome Peaky Blinders acabou virando sinônimo de gangues de rua em Birmingham.

Uma curiosidade é que Steven Knight, produtor e roteirista da série, tem ligação familiar com os Peaky Blinders originais, tendo parentes que foram membros da lendária gangue de Birmingham.


Se eu fosse você, não perderia, afinal, como diz Tom Shelby, “Quando o destino deixa algo valioso em seu colo, você não simplesmente joga no lixo”.

Peaky Blinders está disponível na Netflix.

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