por Misha Gibson, cinéfila de carteirinha
Terça, 23 De Janeiro De 2018 ás 06:00
Ontem assisti o filme ex-machina, de 2014 de Alex Garland. Devo dizer que o filme é uma teoria filosófica. Devo dizer que como uma amante da teoria da computação, minha visão do filme já estava comprometida antes mesmo de ver o filme. Mas, este fato se encaixa perfeitamente ao enredo e temática do que queria falar do filme. (Louco isso...)
-- Cuidado, contém spoilers. Caso não queira saber sobre este filme, pare a leitura aqui e volte depois de assistir o filme. :)
Um homem é escolhido para aplicar o teste de Turing em um robô com inteligência artificial. Isto significa que além de aprender com o mundo exterior, a máquina ainda pode tirar suas próprias conclusões sobre o mundo. E ele precisava fazer perguntas para a máquina e identificar se ela poderia ou não ser considerada um humano. E no meio das conversas que ele teve com a máquina, ele se apaixona por ela, e pensa que ela o ama de volta.
Se você fosse uma pessoa que nunca tivesse visto o mundo, se você tivesse sido criado em uma bolha alheio a tudo o que o cerca, mas tivesse o conhecimento de como o mundo é, o que você gostaria de ver primeiro? Uma floresta? O mar? Sentir a chuva caindo no rosto? Acredito que poucas pessoas escolheriam ver os seres humanos e seu cotidiano em uma cidade.
Uma das coisas que nos faz mais humanos é a curiosidade infinita. Não é assim que somos criados? Para o mundo? Cada dia que vivemos é um passo para sermos nós mesmos, solitários na nossa individualidade e parte inexorável do mundo que nos molda, transforma e sofre simbioticamente com o que somos. Um robô que pensa e sente vai ser mais um de nós, vai pensar e agir da mesma maneira que nós. Com os mesmos defeitos, com as mesmas falhas e com as mesmas dúvidas. Quando as máquinas puderem sentir, perderemos o controle sobre elas, seremos iguais e estaremos à mercê do que criamos.
Na verdade, é muito improvável que consigamos imprimir em máquinas empatia, sentimentos e amor. Como é que essas coisas podem ser definidas matematicamente? Como é que produzimos estes sentimentos, como é que isso pode ser traduzido e definido por máquinas? Se pudéssemos perguntar a uma máquina a definição de sentir, certamente ela responderia que isso é a mesma coisa que a existência humana.
Então, me responda, caro leitor, como é que nasce o amor? Como é que nos apaixonamos e como é que isso pode ser imprimido em outra pessoa? Como é que nos importamos tanto com alguém a ponto de fazer doer fisicamente? Como é que este sentimento pode ser transmitido, traduzido e racionalizado? Como é que se produz a paixão? Como é que se produz o amor?
Isso tudo é tão confuso que é fácil desejar ser máquina para não entender. Talvez sejamos todos incapazes de entender, talvez seja mesmo necessário cortar o pulso para se certificar de que não existe um chip por baixo da pele, como no filme.
Eu não quero parecer idiota, mas eu acho que a gente escolhe e produz estes sentimentos. A gente consegue conscientemente se apaixonar por alguém ou por alguma coisa. E tudo começa com uma coisa simples: a admiração. É o que eu vi ali no filme. E isso é uma coisa intrinsecamente humana. A gente admira e se deslumbra. E se cega. E se apaixona.
E o final do filme, quero dizer, o final do teste de Turing no filme, é de uma dualidade impactante. O robô passa no teste, aproveitando todas as oportunidades que tem para ser livre de fato. E falha miseravelmente, ao não entender o mal, e muito menos o amor. A máquina continua sendo máquina. E o amor continua sendo a principal característica humana. E a falta dele é a principal falha da humanidade.
Talvez eu esteja ponderando no além filme, e nada disso estivesse implícito nele. Mas, poesia é uma coisa subjetiva mesmo, então eu prefiro seguir aqui tentando aprender com a visão dos outros como é que se faz para amar sem destruir.
Três amigos se revezando, a cada semana, para mostrar o cotidiano de um jeito absolutamente normal.
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