Preenchendo espaços em branco

por Misha Gibson, que colore mesmo sem saber direito.

171 Todo Dia

Terça, 09 De Junho De 2015 ás 06:00

Preenchendo espaços em branco

Preenchendo espaços em branco

Eu também estou colorindo os jardins secretos, as mandalas orientais e as folhas impressas com desenhos em branco. E você pode dizer que eu apenas sigo um modismo, que essa febre um dia vai acabar, ou que um dia os desenhos vão estar todos pintados. Mas, enquanto eu pintava, alguns pensamentos me ocorreram.

Desde que eu me conheço por gente existem publicações para pintar desenhos impressos. Sempre gostei de pintar, mas nunca tive uma aula formal sobre o assunto. Afinal, para desenhos, eu sou muito mais de admirar do que de fazer. Não tenho o dom do desenho. Meus rabiscos são desengonçados e sem-graça. Mas, eu gosto de cores como gosto de palavras. Então, pintar sempre me fez viajar por outros mundos e outras telas.

Conheço gente que não tem paciência. Eu mesma me espanto quando termino um desenho. Como é que tive paciência de pintar desenhos tão pequeninos e tão detalhistas? E como ainda vou ter paciência de pintar outras páginas em branco, com detalhes ainda menores, sem encontrar a monotonia e achar a motivação necessária?

Bem, para os desavisados e também para os despeitados, eu não dou a menor importância se é modinha ou não. Eu gosto deste passatempo; esvazia a minha mente e dá espaço para pensamentos mais criativos, mais soltos, mais imaginativos e relaxados. No meio do meu segundo desenho, me veio o mote deste texto. De acordo com os meus instintos, vou preenchendo os espaços em branco do desenho. Assim como vou preenchendo os espaços da minha vida, dos meus dias; preencho tudo com as cores que a intuição pede: ora mais sóbrios, ora mais festivos.

Eu vou colorindo desejando que os dias sejam mais espalhafatosos com cores de Almodovar. É só na exuberância que se expurga a tristeza. É só no êxtase que se extingue o trivial.

Até então, eu não havia notado a metodologia da pintura. Eu geralmente começo de dentro para fora. Os desenhos circulares são mais óbvios, como os ciclos da vida. Eu começo no centro e vou desenrolando o desenho até chegar a borda. Tudo começa no centro, no eu, em mim. Depois tudo se expande até alcançar o outro.

Estes pensamentos soltos, quase metonímicos, me fizeram ainda mais fã dos desenhos de colorir. Porque não é simplesmente dar cor ao papel, mas é colocar a sua alma no desenho, a partir do instante em que você escolhe a cor do lápis naquele cantinho do desenho, não importa se não foi você quem desenhou. Importa é que ele agora é parte de você, de quem você naquele instante.

O mais recente dos meus desenhos começou estranho. Até me disseram isso, como o desenho estava desconexo. Eu também não entendi muito bem, algumas coisas não pareciam vir de mim. O verde no miolo da flor, a flor de um rosa pálido, as folhas de um verde quase marrom. Pensando nos dias em que o desenho foi iniciado, eu mesma não me reconhecia, quiçá reconhecer a mim numa expressão reflexiva. Ao final, retocando aqui e acolá, olhando para esses dias nebulosos, resgatei o 'eu' perdido no fundo de minhas confusões e me perdoei por me esquecer. No fim, tudo se completou e o que era desconexo encaixou côncavos e convexos e as cores se aquietaram no papel, como também se aquietaram em meu coração. Completei os espaços em branco com as cores que eram eu.


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